9 de março de 2016

a memória biocultural

A despeito do que os autores dizem acerca das capacidades biológicas humana, uma coisa é certa: a capacidade de ter uma memória social.
Isso graças ao nível de capacidade de comunicação simbólica (e não à capacidade em si) e ao acúmulo de informação, principalmente pela oralidade e escrita.

Se o Homo sapiens conseguiu permanecer, colonizando e expandindo a sua presença na Terra, é porque foi capaz de reconhecer e aproveitar os elementos e processos do mundo natural, um universo que encerra uma característica essencial: a diversidade. Essa habilidade se deve à manutenção de uma memória, individual e coletiva, que conseguiu se estender pelas diferentes configurações societárias que formaram a espécie humana. Esse traço evolutivamente vantajoso da espécie humana tem sido limitado, ignorado, esquecido ou tacitamente negado com o advento da modernidade, que constitutiu uma era cada vez mais orientada pela vida instantânea e pela perda da capacidade de recordar.

Identificada pela velocidade vertiginosa das mudanças técnicas, cognitivas, informáticas, sociais e culturais que impulsionam umas racionalidade econômica baseada na acumulação, centralização e concentração de riquezas, a era moderna (consumista, industrial e tecnocrática) tornou-se uma época prisioneira do presente, dominada pela amnésica, pela incapacidade de se lembrar tanto dos processos históricos imediatos quanto daqueles de médio e longo prazo.

Essa deficiência está relacionada a uma ilusão alimentada por uma espécie de ideologia do progresso, do desenvolvimento e da mercantilização que não tolera nenhuma forma pré-moderna (e, em sentido estrito, pré-industrial), que é automaticamente qualificada como arcaica, obsoleta, primitiva e inútil. Essa avaliação ideológica, que faz da modernidade um universo autocontido, autojustificado e autodependente, volta-se contra sua própria existência ao suprimir sua capacidade de reconhecer o passado, isto é , ao abrir mão de uma consciência de espécie que é ao mesmo tempo uma consciência histórica baseada em características que vai além do fenômeno humano e alcança todas as dimensões da realidade do planeta: a diversidade.
 trecho de 'A Memória Biocultural', de Víctor M. Toledo e Narciso Barrera-Bassols.

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